Todos os dias, casos de mulheres vítimas de violência doméstica e familiar estampam os noticiários e, para aqueles que atuam no enfrentamento dessa violência, o assunto é considerado não apenas questão de segurança pública, mas também de saúde pública, de direitos humanos e de justiça.
Nesse contexto de agressões físicas, psicológicas, sexuais, patrimoniais e morais, além do assédio e da discriminação baseada no gênero, o Ceará acumula dados sangrentos. O 15º Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostrou que o estado é o segundo do país com a maior taxa de homicídios de meninas e mulheres. De acordo com o levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), a taxa em 2020 foi de sete mortes a cada 100 mil mulheres cearenses. Aquele ano contabilizou 329 vítimas.
Todos os dias, dezenas de mulheres batem à porta da Defensoria Pública do Estado do Ceará (DPCE) em busca de ajuda. No Núcleo de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher (Nudem) de Fortaleza, 8.296 procedimentos foram registrados somente em 2022. Quem chega, é convidada a participar de um levantamento realizado pelo departamento psicossocial para conhecer melhor o perfil da vítima. No ano passado, 518 mulheres participaram da pesquisa, que se debruçou em identificar quem são essas mulheres, se vivenciaram situações de violência na casa dos pais, se conhecem a Lei Maria da Penha, se ainda residem com o agressor ou têm filhos com ele; quanto tempo viveu na situação de violência até a realização da denúncia; se o agressor é reincidente e pretende representá-lo criminalmente, etc.
De acordo com o estudo, 71,04% das mulheres entrevistadas têm filhos com o agressor e 61% delas revelaram que os filhos presenciaram as cenas violentas. “Isso é um dado alarmante porque o estresse psicológico com a situação pode fazer com que essa criança venha a repetir ou aceitar ser vítima de relações abusivas no futuro. Além desses números, a pesquisa revelou que 20% das mulheres ouvidas vivenciaram violência doméstica na casa dos pais quando criança ou adolescente. É um crime que atinge as futuras gerações e nos demonstra que cada vez mais todos os órgãos que compõem a rede de proteção a essa mulher precisam estar juntos para que as pessoas não tenham isso como algo comum”, pontua a supervisora do Nudem Fortaleza, defensora Jeritza Braga.
A violência pode vitimar mulheres em qualquer fase da vida. De acordo com o levantamento da Defensoria Pública, 31,08% das vítimas da pesquisa tinham entre 26 a 35 anos; 25,29% pertenciam à faixa etária entre 36 a 45 anos; 20,27% estavam entre 18 a 25 anos; 18,34% entre 46 a 59 anos; e 4,05% acima de 60 anos. Trata-se de uma mulher preta ou parda (82%), solteiras(54%), que viviam maritalmente com seus ex-companheiros, que possui Ensino Médio completo (37,45%), está desempregada (19,4%), ou trabalha como autônoma informalmente (34%), tem a renda mensal de até um salário mínimo (67,76%), sendo 43,6% participantes de Programas de Transferência de Renda (bolsa família e BPC), reside na Regional V (11,97%) e já sofre com a violência há mais de seis anos (40%) de um agressor que já é reincidente (67% dos casos ouvidos).
De acordo com a psicóloga do Nudem e uma das responsáveis pelos dados, Úrsula Góes, independente da idade, a primeira e mais frequente forma de violência é a psicológica (88,61%), uma prática silenciosa e velada do ex-companheiro (45,3%), namorado, noivo, marido ou o ex-marido, através da qual, muitas vezes de forma dissimulada, alegando amor, cuidado ou ciúme, ele passa a ter comportamentos agressivos, falas ameaçadoras e age de maneira coerciva e manipuladora. “Em nossos estudos, percebemos que essa é a porta de entrada para outros tipos de violência. O que começa como uma expressão de ciúme ou cuidado vai se mostrando uma relação de posse, dominação, exploração e opressão. Um dado que chama a atenção é o fato de a violência contra a mulher ser um fenômeno que tem como algoz alguém com quem a vítima tem uma relação íntima, de amor e afeto. Assim, o lugar de segurança, proteção e acolhimento é exatamente o locus da violência. Isso dificulta para as mulheres realizarem a denúncia, uma vez que elas estariam denunciando o esposo, companheiro, familiar, namorado ou pai dos próprios filhos”, pontua Úrsula.
Legislação
Mesmo após 16 anos da promulgação da Lei n.º 11.340, que leva o nome da cearense Maria da Penha, cujo marido tentou matá-la duas vezes, há ainda mulheres que desconhecem a legislação. Na pesquisa do Nudem, 72% afirmaram conhecer pouco ou nada sobre a lei.
Sancionada em 7 de agosto de 2006, a Lei Maria da Penha já passou por uma série de mudanças para a consolidação do enfrentamento de abusos, agressões e crimes motivados por discriminação de gênero. Não há dúvidas que esse marco legal desenvolve um papel importante no combate e conscientização da violência contra as mulheres. O constante aperfeiçoamento visa proteger ainda mais as vítimas. “Faz pouco tempo que a violência psicológica se configurou como crime e isso é muito importante, pois demonstra melhorias nas políticas públicas. Além de, claro, as medidas protetivas, a criação do juizado de violência doméstica e familiar contra a mulher e o atendimento prioritário de mulheres para atender às vítimas. Mas temos que avançar cada vez mais”, avalia a defensora titular do Nudem, Anna Kelly Nantua. Para ela, é graças à Lei Maria da Penha que cada vez mais as mulheres tomam consciência de seus direitos e buscam o apoio das instituições.
Serviço
ATENDIMENTO A MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA
JUAZEIRO DO NORTE
ONDE: avenida Padre Cícero, nº 4.455, no bairro São José (Casa da Mulher Cearense)
TELEFONE: (85) 9.8976.7750
QUIXADÁ
ONDE: rua Luiz Barbosa da Silva esquina com a rua das Crianças, no bairro Planalto Renascer (Casa da Mulher Cearense)
SOBRAL
ONDE: avenida Monsenhor Aloísio Pinho, s/n, no bairro Cidade Gerardo Cristino (Casa da Mulher Cearense)
CAUCAIA
ONDE: estrada do Garrote, nº 1.310, no bairro Cabatan
TELEFONES: (85) 3194.5068 ou 3194.5069 – 8h às 14h
E-MAIL: caucaia@defensoria.ce.def.br
MARACANAÚ
ONDE: avenida 1, nº 17, no bairro Jereissati I (Shopping Feira Center)
WHATSAPP: 85 9.8400.6261 – 9h às 15h
LIGAÇÃO: 85 3371.8356 – 9h às 15h
E-MAIL: maracanau@defensoria.ce.def.br
FORTALEZA
ONDE: rua Tabuleiro do Norte, s/n, no bairro Couto Fernandes (Casa da Mulher Brasileira)
TELEFONE: (85) 3108.2999 (24 horas)
CRATO
ONDE: rua André Cartaxo, nº 370, no Centro
TELEFONE: (88) 3695.1751 / 3695.1750
Fonte: Portal da Defensoria Pública do Ceará